domingo, 30 de junho de 2013

As crises da sociedade. As sociedades como crise.

A crise ambiental, a crise energética, a crise social, a crise econômica, a crise financeira, a crise moral, todas estas crises, são fenômenos derivados da grande crise que é o desarranjo energético da sociedade da mercadoria, que por sua vez é uma crise da humanidade e da biosfera.
As formas sociais que esta sociedade assume escamoteiam em grande medida esta crise de maior amplitude que é o desarranjo energético da biosfera por uma de suas espécies, a nossa, mas não do planeta.

Aqui devemos separar ambos pois se a biosfera é dependente da existência do planeta, o inverso não é verdadeiro. A história geológica da Terra está relacionada com a história da vida sendo esta um processo superficial e acessório de certos fenômenos geológicos.
A história do planeta é a história de seu resfriamento até o limite extremo do total congelamento do núcleo em um futuro distante. A Terra está esfriando e assim continuará movendo continentes, gerando cadeias de montanhas e vulcões até o esgotamento da sua energia interior.

A biosfera se ocupa de interferir marginalmente neste processo planetário seguindo os ritmos ditados pelos ciclos astronômicos e suas variações, pela crescente irradiação solar e pela entropia errática do núcleo do planeta. Dentro deste quadro, a biosfera é secundária e permanecerá enquanto esta condições maiores estiverem presentes, nos termos de sua sustentação. Há um fluxo médio de energia que deriva destas condições e a vida tem variado e se adaptado às mudanças deste processo, mesmo que não isento de sobressaltos e ameaças de destruição. A extinção da imensa maioria de todas as espécies vivas é testemunho disto. Não há espécies melhores ou piores. Há apenas espécies sobreviventes destes acidentes de maior escala.
Isto posto, onde se situa a humanidade neste cenário?

As sociedades humanas ainda são construções materiais, concretas e objetivas, produtivas e degenerativas energeticamente, da história da ignorância de uma espécie humana que emergiu apenas recentemente da inconsciência gregária dos mamíferos. E assumem uma forma de patologia anti-natureza no impulso de sua perpetuação.
A patologia se manifesta porque estas sociedades também são construções culturais e abstratas, que refletem e projetam a ignorância das condições materiais que lhes sustentam e das quais se originaram.

O que talvez seja mais humilhante ainda, frente a presunção de nossa inteligência autoconsciente – porque há muitas outras inteligências inconscientes – é que talvez venhamos a ser apenas mais um experimento falho a se somar a extensa lista de espécies extintas.
A biosfera não comporta a humanidade tecnológica nos termos impostos pela sociedade da mercadoria que produz, em última instância, lixo, resíduos de uma entropia acelerada. Os ciclos naturais não suficientes para tratar desta sobrecarga artificial que se acumula no ambiente.
É a crise da sociedade da mercadoria que é, por sua vez, a crise da humanidade vista como uma desarranjo energético. Uma aceleração da entropia natural do ambiente.
A produção do lucro requer a existência de uma máquina produtora e consumidora de mercadorias que nos absorve e nos isola em suas entranhas, e que aumenta o consumo das reservas energéticas muito acima da sua capacidade natural de recomposição. A Sociedade da acumulação e do lucro é uma crise em si mesma deste ponto de vista.
A mobilização de recursos na biosfera para a (re)produção desta sociedade doentia, desta “febre”, assume um aspecto ainda mais patológico quando move estas engrenagens em benefício não apenas uma espécie, mas em benefício de pequenos grupos ou mesmo espécimes particulares desta espécie. O lucro e a riqueza pessoal dentro desta sociedade é o ápice e o vértice mais visível – e contraditoriamente reforçado culturalmente - de toda esta profunda disfuncionalidade destruidora.
Somente uma espécie doente pode produzir uma sociedade doente. E somente uma sociedade doente pode produzir tantas patologias metafísicas ao ponto de conferir supremo valor mítico e mistificado de um simulacro de sua natureza, representados e enfeixados numa abstração:
O indivíduo, versão semi-deificada do membro alfa do bando.
O presente estado das sociedades da mercadoria se traduz também em um roubo do futuro, via desarranjo ambiental, quebrando por antecipação o ritmo natural dos ciclos do ambiente.  
Ao aumentar geometricamente a população humana através do consumo e produção de mercadorias, realizado por máquinas que usam energia fóssil em ritmo e escala muito maiores que as que ocorrem naturalmente, estamos trazendo para o tempo presente os que deveriam nascer, dados os processos energéticos da biosfera, no futuro. Estamos antecipando as gerações e com isso estamos acelerando a nossa extinção quando desarranjamos a biosfera.
A sociedade da acumulação em sua reprodução também acumula uma enorme quantidade de resíduos e lixo. A manutenção desta ordem social se reverte em desordem acelerada do seu entorno, para além de suas fronteiras.

No modo atual como estabelecemos e organizamos nossas sociedades produtoras de mercadorias neste planeta, tornamo-nos ameaça à biosfera e a nossa própria sobrevivência.
Caso insistamos neste caminho, certamente a biosfera prevalecerá.
Já sobreviveu a crises maiores que as que eventualmente possamos produzir. O inverso ainda não é verdadeiro e provavelmente nunca será.

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