sábado, 4 de abril de 2009

Sobre o pós-capitalismo

Os movimentos que já foram chamados de "Era de Aquário", "Nova Era", "Terceira Onda" (Alvin Tofler) e outros nomes sonoros tem ganhado força com o avançar das sucessivas crises cada vez mais globais. Emerge uma consciência de que estamos forçando os limites da Terra pela exploração irracional dos recursos naturais, simultaneamente a desestruturação das sociedades pela degradação das relações humanas das quais a mídia é uma das instâncias mais relevantes.
Todos esses movimentos de consciência clamam por um outro modo de vida mais humano, mais solidário, menos destrutível, sustentável, etc.. É consenso que as relações da humanidade consigo mesma e com o ambiente não podem continuar nesta rota de destruição e degradação e deve-se aprofundar o debate, questionar os valores e ações das comunidades humanas em benefício da nossa espécie e do planeta.
Uma parte considerável destes movimentos fala de um "Novo Capitalismo", da correção dos erros e desvios do capitalismo como se este fosse também vítima das crises que se tem acumulado ao longo dos últimos 40 anos (tomando como marco histórico o Maio de 68).
Propostas para reformar o capitalismo sobre outras bases mais éticas, humanas, solidárias - em uma expressão amansá-lo - corrigindo seus supostos desvios, como a crise financeira especulativa, estão na ordem do dia e tem tomado o tempo de muitas pessoas de boa fé.

Mas temo que muito do que se escreve sobre isso tem uma carga razoável de ingenuidade uma vez que deixa-se de perceber que o próprio capitalismo produz essas crises, produz simultaneamente riqueza e miséria, tecnologia e poluição, cultura e ideologia. O entendimento da verdadeira natureza do capitalismo, que requer uma boa dose de teoria, revela a impossibilidade de qualquer reforma ou refundação deste modo de produção que alcançou seus limites neste início de século.
A economia fundada na propriedade privada dos meios de produção, na produção de bens para o mercado, da exploração do trabalho assalariado, com o objetivo último da realização do lucro está na raíz de todas as crises comtemporâneas que se manifestam em múltiplas esferas da vida. Essas crises são as muitas faces de uma mesma realidade, o esgotamento do projeto do capital iniciado há mais de 500 anos. O capitalismo cumpriu sua missão histórica dentro do amplo movimento das civilizações humanas, de trazer ao mundo a capacidade técnica e científica de transformar a natureza, de libertar os homens do trabalho brutal e degradante, desevolvendo a capacidade produtiva da civilização. Todas as conquistas alcançadas pelo desenvolvimento do capitalismo estão ameaçadas pela crise maior e menos vísivel do próprio capitalismo que não tem mais os meios de gerir as forças que ele mesmo libertou.
Por exemplo, o desemprego estrutural, resultado do investimento intensivo de tecnologia na produção, não pode ser solucionado pelo endividamento crescente dos consumidores. Quem não tem emprego não pode consumir apesar da capacidade crescente de produção instalada em todo o mundo exigir novos mercados. Um dos problemas mais agudos é o desemprego e a paralização desta capacidade produtiva pela desorganização do mercado financeiro como estamos assistindo hoje. Como conciliar desemprego e consumo? Não há uma solução para esse problema dentro da lógica do capitalismo. A criação artificial de mercados consumidores como foi o caso dos EUA nos últimos 30 anos cobra agora sua fatura. A migração dos empregos industriais da América do Norte para os sudeste da Ásia, razão do sucesso da China principalmente, criou um vácuo de renda efetiva que foi compensado pelo endividamento das famílias norte-americanas. Enquanto as bolhas especulativas se sucediam as dívidas podiam ser administradas e o consumo via endividamento mantido. Com o desinflar da última e maior das bolhas, a hipotecária, a precariedade resultante da desindustrialização veio a tona. O problema manifesto na crise financeira causado pelo excesso de dinheiro (ativos) e dívidas não pode agora, com se está propondo, ser solucionado com mais dinheiro e dívidas! Não se pode resolver essa situação com mais do mesmo.

A intoxicação da sociedade como produto paralelo da atividade capitalista está contaminando todas as dimensões da vida sobre o planeta. Essa intoxicação se manifesta como poluição, degradação ambiental, degeneração das relações interpessoais, como ativos financeiros e violência, como propaganda ideológica e deformação midiática. E muitas das instituições que encontramos hoje na nossa paisagem social perderam sua função e razão de existir. Qualquer sobrevida dada a elas significa perpetuar a toxidade e decadência que está em curso. Propriedade privada, Dinheiro, mercadorias, lucros, mercado e emprego são instituições sobre as quais se estrutura a sociedade contemporânea e são fundamentos da ordem capitalista. Questionar a validade destas instituições e de outras que lhes são derivadas como a mídia convencional - ideologia do capital - é colocar em perspectiva um novo projeto de civilização.

A internet abre uma janela de oportunidade para o debate do que fazer daqui em diante para a superação dessa sociedade em ruínas, contornando a barreira ideológica da grande mídia que insiste em justificar o 'status quo' do insustentável.
Devemos descer aos fundamentos da Terra para reconstruir nossa sociedade com as poderosas ferramentas que o capitalismo desenvolveu. Cabe-nos perceber que precisamos dessas ferramentas mas não mais do capitalismo. Temos que separar aquilo que vamos levar para o futuro de nossos descendentes daquilo que precisamos deixar para trás porque obsoleto e prejudicial.

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